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Candeia

  • João Baptista M. Vargens
  • 4 de jun. de 2024
  • 3 min de leitura

Atualizado: 12 de jul. de 2024



Texto para ser gravado, solicitado pelo Museu do Samba - RJ

Sábado - 17 de agosto de 1935.


Uma forte luz brilha na João Vicente, em Oswaldo Cruz.

CANDEIA!


Olha a hora, Maria

Ô, Maria é hora

Olha a hora, Maria

Vem com Deus, Nossa Senhora

Olha a hora, Maria

Vou pegar minha viola

Olha a hora, Maria

Galo pra cantar não demora

Olha a hora, Maria

E já vem rompendo a aurora

Olha a hora, Maria


Seu Candeia antecipa a sopa matutina dos domingos para comemorar o nascimento do filho e que levará seu nome. E o samba corre solto...

Rapidamente, crescia o menino Candeia. Futebol, bola de gude, pipa, peão: o universo de um garoto suburbano. Da janela, acompanhava o vai e vem dos trens da Central e dos lotações Cascadura-Deodoro.

Dona Maria, mãe de Candeia, encobria as peraltices do filho único. Seu Candeia era diferente, rigoroso. Nem deixava que o menino se aproximasse da roda de samba no quintal.

Festa de aniversário! Nada de balões, docinhos e bolo. Havia batida de limão, feijão e muito partido-alto. Coisa de gente grande!

Com 13 anos, já dono de seus passos, Candeia atravessa a linha do trem, ao lado de Bubu, Casquinha, Waldir 59 e Altair.


Vai pro lado de lá

Vai pro lado de lá

Vai pro lado de lá

Vai sambar

Me leva pro lado de lá


Aos 14 anos, Candeia ganhou da mãe a fantasia para seu primeiro desfile na Portela, cantando samba do todo-poderoso Manacéa.

Três anos depois, escreve, em parceria com Altair Prego, seuprimeiro samba-enredo:


Foi Tiradentes o Inconfidente

E foi condenado à morte

Trinta anos depois o Brasil tornou-se independente

Era o ideal se formar um país livre forte

Independência ou Morte

D. Pedro I proferiu

Mais uma nação livre era o Brasil


PORTELA! CAMPEÃ! 10 em todos os quesitos!!!!


E foi uma sucessão de vitórias, ao lado de Waldir 59 e outrosparceiros: 1955, 1956, 1957, 1959, 1965.

Candeia torna-se conhecido no universo do samba: partideiro respeitado, compositor de sambas de meio do ano virtuosos.

Pouco tempo depois de passar para a Polícia, uma briga de trânsito, em dezembro de 1965, no cruzamento da Marquês de Sapucaí com a Presidente Vargas, templos do samba. Candeia perde o movimento das pernas.


Me sinto igual uma folha caída

Sou o adeus de quem parte

Pra quem a vida

É pintura sem arte

A flor esperança se acabou

O amor vento levou

 

Após sucessivas operações, Candeia vê-se obrigado a seguir numa cadeira de rodas. E canta...


Deixe-me ir

Preciso andar

Vou por aí

A procurar

Sorrir pra não chorar


E vence os obstáculos...


De qualquer maneira

Meu amor eu canto

De qualquer maneira

Meu encanto

Eu vou sambar

Sentado em trono de rei

Ou aqui nessa cadeira

Eu já disse e já falei

Que seja qual for a maneira

Quem é bamba não bambeia

Falo por convicção

Enquanto houver samba na veia

Empunharei meu violão


E se reconhece...


E o samba que criei

Tão divino ficou

Agora sei quem sou

E o samba que criei

Tão divino ficou

Agora sei quem sou

 

Com limitações de locomoção, Candeia quer os amigos em sua casa, na Mapendi, em Jacarepaguá. Abençoado pelos quitutes da Dona Leonilda, sua mulher, o partido-alto era cantado em bom tom, batido na palma da mão em versos circulares, acompanhando a roda.


Eu não sou africano

Eu não

Nem norte-americano

Ao som da viola e do pandeiro

Sou mais o samba brasileiro

 

Não satisfeito com os rumos tomados por sua querida Portela, lidera a criação do Quilombo, uma escola preocupada em resgatarprincípios basilares do povo do samba. Em 8 de dezembro de 1975- Ora YêYê Ô, Oxum! / Salve Nossa Senhora da Conceição! – o primeiro encontro dos quilombolas.


Da manhã, quero os raios do sol

Quero a luz, que ilumina e conduz

A magia e a fascinação

Voa um poeta nas asas

Da imaginação

A arte é livre e aberta

A imagem do ser criador

Samba é a verdade do povo

Ninguém vai deturpar seu valor


Candeia produzia e participava de livros, filmes, discos, shows, desfiles, debates universitários, programas de televisão. Pareceque sabia que o tempo era curto.

Em 16 de novembro de 1978, uma quinta-feira, a chama virou cometa.

Tão bem disse Luís Carlos da Vila:


A chama não se apagou

Nem se apagará

És luz de eterno fulgor

Candeia

Enquanto o samba viver

O sonho não vai acabar

E ninguém irá esquecer

Candeia


E repetem-se os versos pelos becos, ruelas e avenidas:


Deixa de ser rei

Só na folia

Faça de tua Maria

Uma rainha de todos os dias

E cante um samba na universidade

E verás que teu filho será príncipe de verdade.

Aí, então, jamais tu voltarás

Ao barracão!

Ó, meu irmão!

 

 

 

 

 

                                                                                  

 
 
 

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